Família aceita desafio e guarda lixo orgânico e reciclável produzido. Análise confirma que muita coisa jogada fora poderia ser reaproveitada
(Viviane Favetto)
Ao colocar sua sacolinha de lixo para fora de casa, nem todos se dão conta do impacto desse gesto. Também são poucos que param para pensar se tudo aquilo que está sendo descartado não poderia ter um destino diferente. Por isso, a Gazeta do Povo propôs um desafio para uma família curitibana: guardar durante uma semana todo o lixo produzido na casa. A manicure Mara Panzarini Miranda, o marido João e os filhos Mateus, 13 anos, e Mariana, 19, aceitaram. E o cachorro Nick não ficou de fora. Depois de sete dias, 21 quilos de lixo estavam acumulados.
O coordenador de Gestão Ambiental Grupo Educacional Uninter, Rodrigo Berté, biólogo com doutorado em Meio Ambiente, diz que a família de Mara não foge da média nacional. Lá foram gerados 750 gramas de lixo por dia, por pessoa. Segundo dados do Compromisso Empresarial para a Reciclagem (Cempre), cada brasileiro produz de 700 a 950 gramas diariamente. Dos 21 quilos, 17,6 quilos eram de material orgânico, 2 quilos de recicláveis e 1,4 quilo de não reciclável.
Limpeza Mara conta que sua família sempre fez a separação do lixo que pode ser reciclado, principalmente por insistência do marido dela, João. O professor Berté comenta que a quantidade de reciclável separada durante os sete dias também está na média nacional do que produz uma família com quatro pessoas. A única ressalva feita por ele está relacionada à forma como o material tem sido acondicionado. Segundo ele, o ideal é que as embalagens sejam lavadas antes de serem descartadas. Isso porque as pessoas que coletam esse material não têm local adequado para a limpeza. As embalagens podem ser deixadas dentro da pia e no fim da lavagem da louça elas estarão limpas.
Berté também alerta que não adianta depositar papéis molhados nas sacolas de material reciclável porque eles não podem ser reaproveitados. Além disso, acabam prejudicando a reciclagem de outros materiais. Mas a família de Mara acerta ao separar e descartar todo o lixo do banheiro e os papéis com fezes do cachorro, que só podem ter como destino o aterro sanitário.
Prejuízo O lixo orgânico, de acordo com Berté, pode ser aproveitado para a produção de um composto, desde que a família more em uma casa e tenha terreno suficiente para isso. Se morar em um apartamento – como é o caso da família de Mara –, pouco pode ser feito, completa o professor.
A consultora e instrutora da área de gastronomia do Senac Dione de Araújo analisou o lixo orgânico produzido na casa da manicure. Ela separou, criteriosamente, tudo o que poderia ser reaproveitado e concluiu que dos 17,6 quilos, 8,4 quilos (menos da metade) deveriam realmente ser descartados. Desse ponto de vista, ela sugeriu que a dona da casa aproveitasse inclusive cascas e sementes (veja quadro nesta página).
Independentemente de tanto critério no reaproveitamento dos alimentos, Dione chama a atenção para dois casos que ela considera desperdício. Em sete dias, a família de Mara jogou no lixo 18 pães franceses. Antes mesmo de começar a guardar o lixo, a manicure já havia comentado que isso era comum em sua casa. Segundo ela, porque eles ainda não conseguiram acertar a quantia na hora da compra.
“Estou cansada de fazer torrada e farinha de rosca”, afirma Mara quando ouve essa dica para evitar que o pão vá para o lixo. De acordo com Dione, também dá para fazer pudim e rabanada (veja as receitas nesta página). A instrutora do Senac observa, ainda, que ossos de frango foram para o lixo com muita carne. “Essa carcaça com a carne pode ser usada numa sopa. Outra opção é cozinhar, desfiar e usar a carne em patês, bolinhos, recheio de pastel e molhos”. As dicas são importantes porque o casal e os filhos fazem todas as refeições em casa.
Outra solução para combater o desperdício é uma melhor organização na hora da compra. Os especialistas indicam que o ideal é ir ao supermercado uma vez por mês e só comprar com mais frequência as carnes e as frutas e verduras. Mara diz que para ela é impossível fazer isso porque tanto a sua renda quanto a do marido, que é cabeleireiro, é diária. “Vou ao supermercado quase todos os dias”, confirma. Tanto que Mara não sabe dizer qual é o valor que a família gasta por mês com alimentação.
Nessa casa, em um ano é gerada uma tonelada de lixo. De acordo com a Cavo Serviços e Saneamento, responsável pelos serviços de limpeza urbana em Curitiba, a população de toda a cidade é responsável pela produção de 1,8 mil toneladas diariamente, volume suficiente para encher 150 caminhões de lixo com capacidade para 12 toneladas. Para o professor Berté, esses números devem servir para que a população entenda que o problema do lixo não é só de responsabilidade do poder público, mas de todos. “O que eu faço com o meu lixo?” tem de ser uma pergunta feita diariamente, completa. |